Considerado o Oscar da Ciência Brasileira, o Prêmio CAPES de Tese reconhece os melhores trabalhos de conclusão de doutorado defendidos no Brasil no ano anterior ao da cerimônia, nas áreas de avaliação definidas pela Fundação e que fazem parte do Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG). Dos vencedores, três receberão o Grande Prêmio, um para cada Colégio: Humanidades, Ciências da Vida e Ciências Exatas, Tecnológicas e Multidisciplinar.
A avaliação considera a originalidade, relevância para o desenvolvimento científico, tecnológico, cultural e social, metodologia utilizada, característica da redação, organização do texto e qualidade, além da quantidade de publicações decorrentes da tese. A solenidade de entrega da premiação ocorre em dezembro.
A tese premiada (texto publicado em O Perobal)
Em 2024, a Capes também fez menção honrosa à tese de Doutorado cujo significado para o seu autor extrapola a mera busca por um novo título acadêmico e até traz um significado ainda maior à paternidade.
Engenheiro civil atuando no ramo imobiliário, Paulo Cesar Duarte Júnior decidiu iniciar as pesquisas na área de Engenharia Biomédica com o objetivo de colaborar com a Cardiologia. Este redirecionamento foi impulsionado pelo diagnóstico de Síndrome do Coração Esquerdo Hipoplásico (SCEH) em seu filho recém-nascido, ainda com 30 semanas de gestação, em 2016. A história pessoal é digna de um roteiro cinematográfico e foi contada pela primeira vez em junho de 2023, pela agência UEL.
“A motivação foi a busca por uma solução mais simples e eficaz para o tratamento da Síndrome de Coração Esquerdo Hipoplásico (SCEH), reduzindo o tradicional tratamento estagiado de três cirurgias para apenas uma. Dedico este prêmio aos pais e às crianças que, infelizmente, não conseguiram receber o tratamento adequado. Meu objetivo de vida é desenvolver métodos, ferramentas e materiais que simplifiquem tratamentos médicos complexos, permitindo que um número ainda maior de crianças tenha acesso a cuidados mais eficientes e menos invasivos”, diz o engenheiro.
A referência ao custo dos tratamentos de alta complexidade é feita com o conhecimento de quem precisou permanecer internado ao lado do filho, que também se chama Paulo, por quatro meses. O pequeno bebê de poucos meses de vida passou por quatro cirurgias, duas direcionadas ao tratamento da cardiopatia e duas para o correto reposicionamento do diafragma, no hospital Beneficência Portuguesa, em São Paulo. Os procedimentos – Cirurgia de Glenn e Cirurgia de Fontan – fazem parte de uma complexa estratégia e passaram a ser alvo das pesquisas na tese de doutorado, que foi orientada pelo docente do Departamento de Construção Civil (CTU) e do Programa de Pós-graduação em Engenharia Civil da UEL, Hemerson Donizete Pinheiro e coorientado pelo docente da Universidade Federal de Minas Gerais, Rudolf Huebner.
Defendida com o título “Proposta de Planejamento Cirúrgico de Fontan baseado em Estudos Numéricos e Hemodinâmicos Tridimensionais”, a tese traz uma metodologia inédita que tem o objetivo de embasar novos tratamentos médicos e cirúrgicos. Esta metodologia considera o comportamento das estruturas do sistema cardiovascular (coração e vasos sanguíneos), adota uma modelagem numérica do fluxo cardiovascular e realiza simulações computacionais. Outro objetivo fundamental foi desenvolver o arcabouço teórico para o surgimento de novas ferramentas, como dispositivos biomédicos e tecnologias avançadas em imagens médicas com capacidade de processamento computacional.
Paulo acrescenta que a modelagem do fluxo cardiovascular opera com base em conhecimentos envolvidos na Dinâmica de Fluidos Computacional (CFD), cujos conceitos, equações algébricas e sistemas de equações lineares também são aplicados às indústrias naval e aeronáutica.
Metodologia inédita
Desta forma, por meio de uma perspectiva multidisciplinar e contando apenas com recursos próprios, que o engenheiro desenvolveu uma metodologia inédita para o planejamento de cirurgias em pacientes com cardiopatia congênita, doença que atinge dez a cada mil crianças, sendo que 80% dos casos demandam procedimentos cirúrgicos para aumentar as chances dos pacientes.
Com vistas para compartilhar esse conhecimento, a tese, que já se tornou livro, ainda traz tutoriais de todas as ferramentas utilizadas, boa notícia para cirurgiões e engenheiros que desejam se apropriar do método, além de experimentos virtuais.
Questionado sobre quais aspectos acredita terem sido fundamentais para o bom desempenho no Prêmio Capes, ele cita o ineditismo do tema e a profundidade com que explorou os conhecimentos das áreas de Física, Matemática e Biologia. “A tese demonstrou robustez tanto na Medicina quanto na Engenharia. Ter meu trabalho reconhecido em uma área com poucas interseções foi uma conquista notável. O grande desafio, no entanto, foi alcançar um nível adequado de entendimento em ambas as disciplinas. A força do projeto reside justamente na integração bem-sucedida de dois campos tão complexos, resultando em soluções sólidas e inovadoras.” avalia.
Entretanto, para muito além da premiação, a perspectiva do engenheiro, que ainda atua como pesquisador de pós doutorado do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia e docente convidado no PPG em Engenharia Civil da UEL, é seguir colaborando com um grupo de estudos cujo foco é desenvolver enxertos vasculares de tecidos de engenharia que poderão provocar uma transformação nos procedimentos cirúrgicos.
Graças ao resultados alcançados, destaca o engenheiro, outros projetos colaborativos foram iniciados, posicionando a Universidade Estadual de Londrina ao lado de tradicionais instituições do País na busca por soluções de alta complexidade. Este trabalho envolve a Universidade de São Paulo (USP) e as universidades federais de Santa Catarina (UFSC), Minas Gerais (UFMG) e Rio de Janeiro (UFRJ).
“Estamos trabalhando com uma equipe multidisciplinar composta por médicos, engenheiros químicos, de materiais e mecânicos, além de pesquisadores da UEL como, Miriam Sumini (CCB), e os professores Alexandre Murakami (Departamento de Clínica Cirúrgica), Caio Abércio da Silva (Departamento de Zootecnia) e Guilherme Schiess Cardoso (Departamento de Clínicas Veterinárias)”, adianta.