O PLANEJAMENTO DO ESTÁGIO EM SERVIÇO SOCIAL
Selma Frossard Costa *
* Palestra realizada em 08/10/98 no Curso de Supervisão de Estágio em Serviço Social, na UEL
** Assistente Social Professora adjuntado Departamento de Serviço Social da UEL Mestre em Serviço Social pela UFRJ.

 

INTRODUÇÃO

O estágio aqui em foco é aquele exercido pelo aluno de graduação do Curso de Serviço Social, em diferentes instituições, sejam elas voltadas ao atendimento social, à saúde, à educação, de caráter público ou privado, bem como empresas ou prefeituras municipais.

No âmbito do Curso de Serviço Social da Universidade Estadual da Londrina (UEL), o estágio ocorre sob a supervisão técnica do assistente social do local onde o mesmo é realizado, e da supervisão pedagógica do docente, que é vinculado à instituição de ensino.

Portanto, são três os atores que interagem nesse processo:

• aluno = estagiário
• assistente social do campo = supervisor técnico
• docente = supervisor pedagógico

Para a operacionalização do estágio supervisionado há que se considerar a participação destes três sujeitos, com seus respectivos papéis e funções, cuja interação deve se dar na direção de um processo construtivo da supervisão e do estágio. O aluno, nessa tríade, estabelece o vínculo entre a Instituição e a Universidade. Se isolarmos um desses atores do processo, certamente haverá uma ruptura prejudicando a relação de interdependência e cooperação para o sucesso do estágio.

Duas conclusões iniciais já podemos resgatar dessa reflexão inicial:

• a importância de um relacionamento correto, do ponto vista ético e profissional entre esses três atores;
• planejamento do estágio, do ponto de vista pedagógico e da ação profissional, é o ato primordial desse processo.
Enfocaremos a segunda conclusão por constituir-se em nosso objeto de reflexão nesse momento.

I. O Estágio Supervisionado e o Planejamento: uma relação fundamental

Por que o planejamento do estágio é importante?

Porque, quando planejado, as diretrizes da ação do estagiário são definidas com clareza; tanto o supervisor técnico quanto o supervisor pedagógico têm consciência daquilo que podem esperar do aluno, além do suporte que devem dar nas supervisões. O risco de cair no “ativismo”; isto é, na mera execução de tarefas diárias sem uma compreensão maior do “por que” e “para que” do estágio e das atividades concernentes, fica bastante reduzido.

E, o instrumento fundamental que direciona o estágio, consubstanciando-se na “bússola” que orienta todo o processo, é o plano de estágio, para o qual alguns princípios são importantes de serem considerados:

• Deve ser elaborado logo no início do estágio pelo supervisor técnico e supervisor pedagógico, com a participação do estagiário;
• Deve contemplar os objetivos em duas grandes frentes:

¨ Os pedagógicos: voltados para o aluno; para os conhecimentos mínimos que ele deve alcançar naquele período de estágio, dentro do processo de formação profissional;

¨ Os definidos no projeto específico onde o estagiário irá atuar, em função da realidade onde ocorrerá a intervenção. São os objetivos voltados para a ação profissional.

• Esses dois níveis de objetivos não se excluem e nem ocupam maior importância um em relação ao outro. Complementam-se à medida em viabilizam o atendimento tanto à finalidade da formação profissional do aluno, quanto do atendimento adequado ao usuário, à população.

Portanto, não é um plano comum; o estágio requer um planejamento específico, no sentido de garantir o alcance dos dois níveis de objetivos ali presentes.

Mas, antes de refletirmos sobre a elaboração do plano de estágio, do ponto de vista metodológico, vamos resgatar um pouco a compreensão que temos sobre planejamento.

No contexto da nossa profissão, estamos sempre em contato com a questão do planejamento. Somos instados, com freqüência, a elaborarmos planos, programas e projetos frente às demandas que surgem no cotidiano de nossa prática, e a participar de diferentes projetos multiprofissionais para colaborarmos com nossa conhecimento e experiência na área do social.

O ato de planejar é inerente ao ser humano. Mesmo sem perceber ele constantemente está planejando suas atividades desde as mais rotineiras e simples até as mais complexas, que definem sua vida no sentido mais amplo.

No contexto profissional esse ato assume uma importância fundamental à medida em que as decisões a tomar vão se tornando mais complexas. Quanto mais difíceis os objetivos, as dificuldades, os obstáculos; quanto mais escassos os recursos, quanto mais complicada a questão política presente, mais se torna necessário o ato de planejar.

Muitas definições existem sobre planejamento. Citamos três:

Trata-se de um processo sistemático, através do qual os integrantes de uma organização identificam e definem ações que precisam ser executadas para superar problemas, fortalecer potencialidades e alcançar objetivos comuns. Surge para redirecionar os caminhos, melhorando as ações. (Amencar, 1997, p. 6)

...ele consiste exatamente no processo de explicar a realidade desejada e de construir (transformar) a realidade existente tendo como rumo aquela realidade desejada. O planejamento é, justamente, a inteligência que dá eficácia a esse processo. (Gandin, 1995, p. 41)

...processo permanente e metódico de abordagem racional e científica de problemas.” (Baptista, 1981, p. 13)

A primeira característica do planejamento, que observamos nesses conceitos, é que ele é um processo! Não se esgota em si mesmo. Está em constante “vir-a-ser”, resultante da dinamicidade da realidade e das próprias mudanças que ele produz durante sua execução. Portanto, é flexível.

A segunda característica é que, enquanto processo, ele guarda em si três operações básicas: reflexão, decisão, ação e avaliação/revisão 1 .

Enquanto ato de reflexão e decisão, o planejamento pré-determina o que, por que, como, quando e com quanto fazer, bem como os obstáculos, as dificuldades e as barreiras.

Mas, o planejamento não é apenas um ato de reflexão e decisão. É também ação e revisão. O planejamento é uma idéia em ação! É comum incorrermos no erro de pensarmos o planejamento apenas como momento de elaboração quando se reflete e se decide sobre o trabalho a ser realizado. Isto nos leva a uma terceira característica do planejamento. Ele é vivenciado em três grandes momentos:

• Elaboração
• Execução
• Avaliação

Qualquer Plano, Programa ou Projeto, apenas tem sentido à medida em que for executado, e sua execução só tem sentido à medida em que for avaliada em um processo contínuo de relação dialética, de realimentação teórico-prática.

A quarta característica resgatamos de Baptista (1981, p. 13) quando afirma que o processo de planejamento guarda em si quatro dimensões básicas: a Racional, a Política, a Valorativa e a Técnico-administartiva.
E, finalmente, a quinta característica que gostaríamos de ressaltar é que o planejamento pode ser operacionalizado a partir de duas grandes concepções:

• Tecnocrática
• Participativa

Dentro da proposta de ação do Serviço Social, sempre buscamos e incentivamos o planejamento participativo por considerarmos este mais coerente com nossas convicções políticas e profissionais, embora nem sempre isso seja possível, dentro do contexto das instituições onde atuamos.

A partir dessas características, percebemos que o processo de planejamento parte do estudo, reflexão e compreensão de uma determinada realidade, não isolando-a do contexto mais amplo que a condiciona e a determina. E esse estudo é realizado a partir da concepção de homem, mundo e sociedade que a equipe planejadora tem. Conforme a postura política e ideológica desta, a direção do processo estará mais voltada para o planejamento participativo ou tecnocrático.

Quanto ao aspecto metodológico, consideramos que o processo de elaboração do planejamento deve ocorrer, basicamente, a partir de quatro etapas:

1ª) Compreensão da situação conjuntural e institucional para obtermos clareza de onde e como estamos. É o conhecimento da situação real;

2ª) Definição do que queremos, estabelecimento do nosso alvo, da nossa utopia. É a configuração da situação idealizada;

3ª) Estabelecimento da distância entre o real e o desejado, apontando o diagnóstico; isto é, as dificuldades e obstáculos presentes que devem ser superados no sentido de alcançarmos o alvo estabelecido;

4ª) Definição do caminho a seguir, da programação que indicará os objetivos, as etapas, as atividades, os instrumentos...para a distância diagnosticada entre o real e o ideal ser superada.

Ressaltamos que, nesse processo, a avaliação é presença contínua, através de instrumentos, indicadores e meios pré estabelecidos.

Dessa forma, o planejamento estará expressando seu aspecto operacional: o que fazer, como fazer, com o que fazer.

Mas, fundamentalmente, seu aspecto político-social: para que fazer, por que fazer e para/com quem fazer.

A partir desses apontamentos, quando nos reportamos ao contexto do estágio supervisionado, podemos inferir que neste:

• Planejamento é sempre um processo a ser vivenciado em seus três momentos: elaboração, execução e avaliação, tendo um caráter primordialmente participativo, onde o supervisor técnico, o supervisor pedagógico e o estagiário são sujeitos fundamentais;
• Plano de Estágio deve expressar as diretrizes operacionais e político-sociais do estágio, observando-se, quando de sua elaboração, as quatro etapas metodológicas apontadas acima.

Mas, em se tratando do Plano de Estágio, reafirmamos que este traz em si o aspecto pedagógico, que deve ser explicitado tanto quanto o aspecto da ação a ser executada pelo estagiário na instituição campo de estágio. Não estamos falando de plano pedagógico de um lado e de plano de atuação de outro, como se no contexto do estágio estes pudessem ser pensados separadamente. A nossa proposta é da elaboração de um plano de estágio que contemple esses dois grandes aspectos que se complementam e interrelacionam viabilizando uma experiência construtiva para todos os sujeitos envolvidos no processo, incluindo neste também o usuário para quem a ação do estagiário se volta.

Nesse sentido, para concluir, apresentamos em anexo, uma sugestão de roteiro de Plano de Estágio, elaborado a partir dessas reflexões e de nossa prática como supervisora de estágio em vários campos, particularmente na área da Saúde e também da Criança e do Adolescente.


NOTAS

1 Essas operações foram distinguidas por Francisco Whitaker Ferreira (1965) e citadas por Myriam Veras Baptista (1981) [voltar]


ANEXO

Roteiro para elaboração do Plano de Estágio

1. IDENTIFICAÇÃO:
1.1. Título
1.2. Projeto
1.3. Instituição
1.4. Estagiária(s) e Série(s)
1.5. Supervisor Pedagógico
1.6. Supervisor Técnico
1.7. Período previsto para a realização do estágio
1.8. Dias e horários do Estágio
1.9. Dias e horários da Supervisão

2. JUSTIFICATIVA / PROBLEMATIZAÇÃO

(Justificar a importância do trabalho a ser desenvolvido indicando as principais dificuldades e/ou defasagens tanto no aspecto pedagógico (voltado para o aluno) quanto no aspecto da atuação (voltado para a população usuário).
Sugestão de conteúdo:
• Caracterização geral da Instituição campo de Estágio
• Caracterização geral do Projeto (quando for o caso)
• Caracterização geral da população usuária
• Descrição sucinta da atuação do Serviço Social na Instituição
• Breve delimitação do perfil do estagiário (série, experiências anteriores, conhecimento da área, etc.)
• Dificuldades percebidas para o desenvolvimento do trabalho
• Quanto à dinâmica institucional, à proposta do Projeto, à atuação do Serviço Social, etc., na perspectiva técnica, política e administrativa
• Quanto às limitações pessoais e pedagógicas sentidas pelo estagiário.
3. OBJETIVOS:

3.1. PEDAGÓGICOS: (voltados para o aluno)

3.1.1. GERAL: (Já definido pelo Curso de Serviço Social. O supervisor pedagógico repassa para o aluno no início do estágio)

3.1.2. COMPORTAMENTAIS

Espera-se que até o final de 3 EST (410 e 411 para o turno matutino; 414, 415 e 416 para o turno noturno) o aluno esteja apto a:
(É definido pelo supervisor em conjunto com o aluno, a partir da problematização pedagógica explicitada na Justificativa, e do Programa já definido para 3 Est. 410, 3 Est. 411, 3 Est. 414, 3Est. 415 ou 3 Est. 416.)
(É o que o estagiário deverá alcançar em termos de aprendizagem, naquele ano, dentro de seu processo de formação profissional)

3.2. DA AÇÃO PROFISSIONAL: (voltado para a população usuária)

3.2.1. GERAL:
(É o objetivo a ser alcançado com a atuação do Serviço Social, através da ação do estagiário, junto à população usuária).
(Geralmente já está definido pelo Sub-projeto de Atuação específico do Serviço Social vinculado a um Projeto e/ou Programa. Se não está definido, o estagiário, juntamente com o Supervisor Técnico deverão fazê-lo).

3.2.2. ESPECÍFICOS:

(É a decodificação do Objetivo Geral. Normalmente quando este já está definido, os específicos também estão. Caso contrário, deverão ser elaborados também)
4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

4.1. QUANTO AOS OBJETIVOS PEDAGÓGICOS:

Os objetivos pedagógicos serão alcançados a partir dos seguintes momentos:
(Indicar as etapas / momentos pensados a partir dos objetivos comportamentais, item 3.1.2, indicando também as atividades e instrumentos para cada etapa.)

4.2. QUANTO AOS OBJETIVOS DA AÇÃO PROFISSIONAL

Os objetivos específicos serão alcançados a partir dos seguintes momentos:
(Indicar as etapas / momentos pensados a partir dos objetivos específicos, item 3.2.2, indicando também as atividades e instrumentos para cada etapa)

5. SISTEMA DE CONTROLE E AVALIAÇÃO

(Indicar os instrumentos que serão utilizados para o controle da execução planejada, e também para a avaliação pedagógica e dos resultados obtidos junto à população usuária)

6. BIBLIOGRAFIA BÁSICA
(Indicada pelos Supervisores)

Data _____/_____/_____

Estagiário__________________________________________

Supervisor Técnico_____________________________

Supervisor Pedagógico_________________________


BIBLIOGRAFIA

AMENCAR. Subsídios Complementares ao Planejamento Estratégico. Caderno de Estudo. Recife, 1997.

BAPTISTA, M. V. Planejamento. Introdução à metodologia do Planejamento Social. São Paulo : Moraes, 1981.

DALMÁS, A. Planejamento Participativo na Escola. Petrópolis : Vozes, 1994.

GANDIN. D. A Prática do Planejamento Participativo. Petrópolis : Vozes, 1995.

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