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EDO: Equação de Euler-Cauchy
Ulysses Sodré

1 A Equação equidimensional de Euler-Cauchy

A Equação equidimensional de Euler (ou de Cauchy) é uma equação diferencial ordinária linear (EDOL) da forma

\[a_n x^n y^{(n)}+a_{n-1}x^{n-1}y^{(n-1)}+\cdots+a_1 x y'+a_0y=g(x)\]

onde \(n\in N\) que fornece a ordem da equação se \(a_n\neq 0\) e os \(a_k\) são números reais (\(k=0,1,2,...,n\)).

Na sequência tratamos apenas das EDOL de Euler que são homogêneas. Para resolver as EDOL de Euler não homogêneas, deve-se usar o método da variação dos parâmetros.

Solução: Para resolver esta equação, procuramos obter números reais ou complexos \(r\) de forma que \(y(x)=x^r\), seja solução da EDOL dada, para cada \(r\) possível.

Assim, obtemos \(n\) soluções LI que resolvem a EDOL homogênea associada à equação dada. Sob esta hipótese, temos que:

\begin{align} y' &= r x^{r-1} \\ y'' &= r(r-1) x^{r-2} \\ y^{(k)} &= A(r,k) x^{r-k} \end{align}

onde \(A(r,k)=r(r-1)(r-2)...(r-k+1)\) é o arranjo de \(r\) elementos com a taxa \(k\).

Para facilitar os trabalhos, vamos considerar o caso geral de uma EDOL não homogênea de Euler de ordem \(n=2\), isto é:

\[a x^2 y'' + b x y' + ... + c y = g(x)\]

A equação homogênea associada aqui é \(ax^2y''+bxy'+cy=0\) e substituindo tanto a função \(y=y(x)\) como as suas derivadas obtemos:

\[x^r (a r(r-1) + b r + c) = 0\]

Como procuramos soluções linearmente independentes (LI), devemos ter que

\[a r(r-1) + b r + c = 0\]

que simplificada, nos fornece a equação indicial da EDOL de Euler:

\[a r^2 + (b-a) r + c = 0\]

Como esta equação indicial é do segundo grau, temos três possibilidades: duas raízes reais e distintas, duas raízes reais e iguais e duas raízes complexas conjugadas. Realizaremos agora uma análise desse casos:

Duas raízes reais e distintas: Se \(r\) e \(s\) são as tais raízes, \(y_1(x)=x^r\) e \(y_2(x)=x^s\), e a solução da homogênea será:

\[y(x) = C_1 x^r + C_2 x^s\]

Exemplo: Seja a EDOL de Euler \(L(y)=x^2y''-2xy'+2y=0\). A equação indicial associada é \(r^2-3r+2=0\) cujas raízes são \(r=1\) e \(r=2\), logo a solução geral é:

\[y(x) = C_1 x + C_2 x^2\]

Duas raízes reais e iguais: Se \(r\) é uma raiz dupla, \(y_1(x)=x^r\) e a segunda função é dada pela multiplicação de \(x^r\) por \(\ln(x)\), isto é:

\[y_2(x) = x^r \ln(x)\]

logo a solução da homogênea será:

\[y(x) = C_1 x^r + C_2 x^r \ln(x)\]

Exemplo: Seja a EDOL de Euler \(L(y)=x^2y''-3xy'+4y=0\). Tomando \(y(x)=x^r\), obtemos:

\[L(x^r) = (r^2 - 4r + 4) x^r\]

Assim a equação indicial associada é \(r^2-4r+4=(r-2)^2=0\), que tem uma raíz dupla r=2, logo uma solução é:

\[y_1(x) = x^2\]

e a segunda solução tem a forma:

\[y_2(x) = \ln(x) y_1(x) = x^2 \ln(x)\]

Justificativa: Vamos retomar a expressão já obtida antes e realizar um detalhamento para justificar esta multiplicação por \(\ln(x)\).

Como:

\[L(x^r) = (r-2)^2 x^r\]

então, aplicando o operador diferencial em relação a variável \(r\), aqui denotado por D_r, obtemos:

\[D_r L(x^r) = D_r[(r-2)^2 x^r]\]

Como os operadores diferenciais \(D_r\) e \(L\) comutam, podemos reescrever esta última expressão como:

\[L(D_r (x^r)) = D_r[(r-2)^2 x^r]\]

Como estamos fazendo a derivada em relação à variável \(r\), nosso trabalho é um pouco maior e neste caso:

\[D_r(x^r)=D_r [e^{r\ln(x)}]=\ln(x)D_r[e^{r\ln(x)}]=\ln(x) x^r\]

o que garante que

\[L[\ln(x) x^r] = 2(r-2)x^r + (r-2)^2 \ln(x) x^r\]

Neste caso, sabemos que o autovalor é \(r=2\) e tomando \(r=2\) na última expressão obtemos:

\[L[ \ln(x) x^2] = 0\]

Como o operador \(L\) aplicado a esta função fornece um resultado nulo, segue que esta é uma outra solução da EDOL de Euler, ou seja:

\[y_2(x) = x^2 \ln(x)\]

Como o conjunto formado pelas funções \(y_1\) e \(y_2\) é linearmente independente, podemos escrever a solução geral como:

\[y(x) = C_1 x^2 + C_2 x^2\ln(x)\]

ou seja

\[y(x) = x^2 [ C_1 + C_2 \ln(x)]\]

Exemplo: Seja agora uma EDOL de Euler de terceira ordem \(x^3y^{(3)}+6x^2y''+7xy'+y=0\). Tomando \(y(x)=x^r\) segue que:

\[x^r ( r^3 +3 r^2 + 3 r + 1) = 0\]

Observamos que a equação indicial (característica) é:

\[r^3 +3 r^2 + 3 r + 1 = 0\]

e tem a raiz tripla \(r=-1\), garantindo uma primeira solução:

\[y_1(x) = x^{-1}\]

Com um processo similar ao do exemplo anterior, multiplicamos \(y_1\) por \(\ln(x)\) para obter:

\[y_2(x) = x^{-1} \ln(x)\]

e multiplicamos \(y_2\) por \(\ln(x)\) para obter:

\[y_3(x) = x^{-1} (\ln(x))^2\]

e a solução geral desta EDOL de Euler é:

\[y(x) = x^{-1} [ C_1 + C_2\ln(x) + C_3\ln^2(x)]\]

Duas raízes complexas conjugadas: Se as raízes são dadas por \(r_1=a+bi\) e \(r_2=a-bi\), poderíamos usar as funções complexas, como:

\[y_1(x) = x^{a+bi}, \quad y_2(x) = x^{a-bi}\]

mas isto nem sempre é adequado, pois procuramos funções reais válidas para x>0.

Vamos operar com as partes real e imaginária do número complexo \(r=a+bi\) para obter a solução da EDOL homogênea de Euler. Usando a relação de Euler, que afirma que \(\exp(pi)=\cos(p)+i\text{sen}(p)\), podemos escrever:

\begin{align} y(x) &= x^{a+bi} = x^a x^{bi} \\ &= x^a\exp[b\ln(x)\;i] \\ &= x^a [ \cos(\ln(x^b)) + i \text{sen}(\ln(x^b))] \\ &= [x^a\cos(b\ln(x))] + i [ x^a\text{sen}(b\ln(x))] \end{align}

Desse modo, tomamos as partes real e imaginária desta última função como as duas soluções LI procuradas, que são as funções reais:

\begin{align} y_1(x) &=x^a\cos(b\ln(x)) \\ y_2(x) &=x^a\text{sen}(b\ln(x)) \end{align}

e a solução geral da EDOL homogênea associada é:

\begin{align} y(x) &= C_1 x^a\cos(b\ln(x))+ C_2 x^a\text{sen}(b\ln(x)) \\ &= x^a [ C_1\cos(b\ln(x)) + C_2\text{sen}(b\ln(x))] \end{align}

Exemplo: A EDOL de Euler \(L(y)=x^2y''+xy'+4y=0\) tem equação indicial \(r^2+4=0\), cujas raízes são \(r=2i=0+2i\) e \(r=-2i=0-2i\), assim:

\begin{align} y_1(x) &= x^0 \cos(\ln(x^2)) = \cos(2\ln(x)) \\ y_2(x) &= x^0 \text{sen}(\ln(x^2)) = \text{sen}(2\ln(x)) \end{align}

e a solução geral da EDOL homogênea associada é:

\[y(x) = C_1 \cos(2\ln(x)) + C_2 \text{sen}(2\ln(x))\]