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EDO: Equações de Primeira Ordem
Ulysses Sodré

Material desta página

1 As formas normal e diferencial

Muitas equações diferenciais ordinárias de 1a. ordem podem ser escrita na sua forma normal, dada por:

\[y' = f(x,y)\]

Se a função \(f=f(x,y)\) pode ser escrita como o quociente de duas outras funções \(M=M(x,y)\) e \(N=N(x,y)\), obtemos:

\[y' = M(x,y)/N(x,y)\]

Em geral, usamos o sinal negativo antes de \(M(x,y)\):

\[y' = - \frac{M(x,y)}{N(x,y)}\]

para poder reescrever:

\[M(x,y) dx + N(x,y) dy = 0\]

Exemplos de EDO::

  1. \(y'=\cos(x+y)\) está na forma normal.
  2. \(y'=x/y\) está em sua forma normal, mas pode ser reescrita na forma diferencial \(xdx-ydy=0\).

2 Equações Separáveis

Seja uma EDO \(M(x,y)dx+N(x,y)dy=0\). Se \(M\) é uma função apenas da variável \(x\), isto é \(M=M(x)\) e \(N\) é função apenas da variável \(y\), isto é \(N=N(y)\), então a equação dada fica na forma:

\[M(x) dx + N(y) dy = 0\]

esta EDO é denominada EDO separável. Tal fato é motivado pelo fato que é possível separar as funções de modo que cada membro da igualdade somente possua um tipo de variável e assim poderemos realizar a integração de cada membro por um processo bastante simples.

Exemplo: A EDO \(y'=x/y\), está na forma normal e pode ser reescrita na sua forma diferencial \(xdx-ydy=0\), assim, \(xdx=ydy\), então integrando cada termo de forma independente, obtemos:

\[\frac12 x^2 + C_1 = \frac12 y^2 + C_2\]

e reunindo as constantes em uma constante C, obtemos:

\[x^2-y^2 = C\]

Esta relação (que não é uma função) satisfaz à EDO dada.

3 Equações Homogêneas

Uma função \(f=f(x,y)\) é homogênea de grau \(k\) se, para todo \(t\) real, tem-se que:

\[f(tx,ty) = t^k f(x,y)\]

Uma função \(f=f(x,y)\) é homogênea de grau \(0\) se, para todo \(t\) real, se tem que:

\[f(tx,ty) = f(x,y)\]

Exemplos: Funções homogêneas

  1. \(f(x,y)=x^2+y^2\) é de segundo grau.
  2. \(f(x,y)=(x/y)^2\) é de grau zero.
  3. \(f(x,y)=\arctan(y/x)\) é de grau zero.

Uma forma simples de observar a homogeneidade de uma função polinomial é constatar que todos os monômios da função têm o mesmo grau e no caso de uma função racional (quociente de polinômios), todos os membros do numerador têm um mesmo grau e todos os membros do denominador também possuem um mesmo grau.

Uma EDO na forma normal \(y'=f(x,y)\) é homogênea se a função \(f=f(x,y)\) é homogênea de grau zero.

Exemplos de EDO homogêneas:

  1. \(y'=(x^2+y^2)/xy\)
  2. \(y'=x^2/y^2\)
  3. \(y'=\arctan(y/x)\)

Resolvemos uma EDO homogênea, transformando-a em uma EDO com variáveis separáveis com a substituição \(y(x)=x\;v(x)\) onde v=v(x) é uma nova função incógnita.

Se \(y(x)=x\;v(x)\) então \(dy=xdv+vdx\). Assim, uma equação da forma \(y'=f(x,y)\) pode ser transformada em uma equação separável da forma:

\[x dv/dx + v = f(x,xv)\]

e após algumas mudanças obtemos uma equação com variáveis separáveis.

Exemplo: A EDO \(y'=(x^2+y^2)/xy\) pode ser transformada em uma EDO separável com \(y=xv\) e \(y'=x\;v'+v\), para obter a sequência de operações:

\[x v ' + v = (1+v^2)/v\]

que se escreve

\[x v ' + v = 1/v + v\]

cuja simplificação é

\[x v ' = 1/v\]

que pode ser posta na forma

\[x dv/dx = 1/v\]

de onde obtemos

\[v dv = dx/x\]

Integrando ambos os membros, obtemos \(v^2=2\ln(x)+C\), logo:

\[y^2=x^2(2\ln(x)+C)\]

4 Equações Exatas

Na sequência usamos a notação \(M_x\) para a derivada parcial da função \(M=(x,y)\) em relação à variável \(x\). Seja uma equação na forma diferencial \(M(x,y)dx+N(x,y)dy=0\). Esta EDO é exata se existe uma função \(F=F(x,y)\) cuja diferencial exata \(dF=F_x dx+F_y dy\) coincide com o termo da esquerda da EDO:

\[M dx + N dy = 0\]

isto é:

\[dF = M(x,y) dx + N(x,y) dy\]

Estudando propriedades de diferenciabilidade das funções \(M\) e \(N\), podemos ter um outro critério para a garantia que esta equação é exata.

Dizemos que a equação \(Mdx+Ndy=0\) é exata se: \(M_y = N_x\).

Exemplos:

  1. A forma diferencial \(3x^2y^2dx+2x^3ydy=0\) é exata pois existe \(F(x,y)=x^3y^2\) cuja diferencial exata coincide com o membro da esquerda da equação dada. Outra forma de verificar isto é mostrar que \(M_y=N_x=6x^2y\).
  2. A forma diferencial \(xdx+ydy=0\) é exata.
  3. A forma \(M(x)dx+N(y)dy=0\) é exata.
  4. A forma \(ydx-xdy=0\) NÃO é exata.

5 Equações Lineares

Seja uma equação diferencial da forma

\[a_0(x) y' + a_1(x) y = b(x)\]

Vamos considerar que todas as condições necessárias para poder resolver esta equação sejam satisfeitas.

O melhor que podemos fazer quando \(a_0(x)\neq 0\), é dividir todos os termos da equação por a_0(x) para obter:

\[y' + p(x) y = q(x)\]

Um bom método para resolver esta equação de uma forma geral é multiplicar ambos os membros da equação por uma função \(M=M(x)\) denominado Fator Integrante de tal modo que o termo da esquerda da nova equação:

\[M(x) y'(x) + M(x) p(x) y(x) = M(x) q(x)\]

seja a diferencial da função \(M(x)y(x)\), isto é:

\[d[M(x)y(x)] = M(x) y'(x) + M(x) p(x) y(x)\]

mas para que isto ocorra, a função \(M=M(x)\) deve satisfazer à condição:

\[M(x) y'(x) + M'(x) y(x) = M(x) y'(x) + M(x) p(x) y(x)\]

que equivale a \(M'(x)y(x)=M(x)p(x)y(x)\), mas se y(x)0, esta equação é equivalente à forma mais simples \(M'(x)=M(x)p(x)\).

Resolvendo primeiro esta última equação diferencial, obtemos:

\[M(x) = \exp\left[\int p(x)dx)\right]\]

Denotando a integral da função \(p=p(x)\) (minúscula) por \(P=P(x)\) (maiúscula), podemos escrever a função multiplicadora por

\(M(x) =\exp[P(x)]\). Multiplicando os membros desta equação por

\(\exp[P(x)]\), obtemos:

\[\exp[P(x)] y' + p(x)\exp[P(x)] y(x) = q(x)\exp[P(x)]\]

O membro da esquerda é a derivada de \(y(x)\exp[P(x)]\) em relação à variável \(x\), assim podemos escrever:

\[\frac{d}{dx}(y(x)\exp[P(x)]) = q(x)\exp[P(x)]\]

Integrando ambos os membros da igualdade, obteremos:

\[y(x)\exp[P(x)]= \int q(x)\exp[P(x)]dx + C\]

e dessa forma temos uma expressão para \(y=y(x)\):

\[y(x)= \exp[-P(x)](\int q(x)\exp[P(x)] dx + C)\]

Exemplo: Para a EDO \(y'+2xy=x\), \(p(x)=2x\) e \(q(x)=x\), logo a solução depende de \(P(x)=x^2\) e assim:

\[y(x) = \exp(-x^2)(\int\exp(x^2)xdx + C)\]

logo

\[y(x) = \exp(-x^2) [\frac12 \exp(x^2) + C]\]

ou seja, a solução da EDO dada é:

\[y(x) = \frac12 + C \exp(-x^2)\]

6 Equações não lineares redutíveis a lineares

Obter soluções para equações diferenciais não lineares é difícil porém existem algumas equações que mesmo sendo não lineares, podem ser transformadas em equações lineares. Os tipos mais comuns de tais equações são:

Equação de Bernoulli: É uma equação diferencial não linear da forma

\[y' + p(x) y = q(x) y^n\]

Ao tomar a substituição \(w=y^{1-n}\), observamos que \(w\) depende indiretamente da variável x e teremos a equação:

\[w' + (1-n) p(x) w = (1-n) q(x)\]

que é uma EDO linear de primeira ordem.

Equação de Riccati: É uma equação diferencial não linear da forma

\[y' = p(x) + q(x) y + r(x) y^2\]

Aqui, um fato grave é que não é possível resolver tal equação se não pudermos apresentar uma solução particular para a mesma, assim tomamos \(y_p\) uma solução particular de

\[y' = p(x) + q(x) y + r(x) y^2\]

e construímos uma nova função z definida por:

\[z = 1/(y-y_p)\]

Com alguns cálculos simples, obtemos:

\[z' + [q(x) + 2 y_p r(x)] z = r(x)\]

que é uma EDO linear na variável z. Após resolvida esta última, voltamos à variável original y, com a relação:

\[y = y_p + \frac{1}{z}\]

Exemplos: Para resolver a equação de Riccati \(y'=-2-y-y^2\), tomamos \(y(x)=2\) que é uma solução particular para a EDO dada, realizamos a substituição: \(z=1/(y-2)\) com \(y'=-z'/z^2\), para obter a equação linear em \(z\):

\[z' + 3 z = -1\]

cuja solução é:

\[z(x) = -\frac13 + C \exp(-3x)\]

e com alguns poucos cálculos podemos voltar à variável y para obter a solução procurada.

Exercício: Resolver a EDO não linear \(2xy\;y'+(x-1)y^2=x^2\exp(x)\), usando a substituição: \(y^2=xz\).