Introdução ao conceito de Integral

A derivada e a integral são duas noções básicas do Cálculo Diferencial e Integral. Do ponto de vista geométrico, a derivada está ligada ao problema de traçar a tangente a uma curva enquanto que a integral está relacionada com o problema de determinar a área de certas figuras planas, mas também possui muitas outras interpretações possíveis. Na realidade, a grande descoberta de Newton e de Leibniz foi que a Matemática, além de lidar com grandezas, é capaz de lidar com a variação das mesmas.

Elementos históricos sobre a Integral

A idéia básica do conceito de integral já estava embutida no método da exaustão atribuído a Eudoxo (406-355 a.C.), mas foi desenvolvido e aperfeiçoado por Arquimedes (287-212 a.C.), grande matemático da escola de Alexandria. Pode-se obter a área de uma figura plana irregular ou obter o volume de um sólido com o formato de um barril.

barril

O método da exaustão consiste em "exaurir" a figura dada por meio de outras de áreas e volumes conhecidos. O caso mais conhecido é o famoso problema da quadratura do círculo, isto é, o problema de obter um quadrado com a mesma área de um círculo de raio r dado.

Uma primeira aproximação para a área do círculo é dada pela área do quadrado inscrito no círculo. Com o acréscimo de quatro triângulos isósceles convenientes, obtemos o octógono regular inscrito no círculo, cuja área fornece uma aproximação melhor à área do círculo.

Continuando com o processo de acrescentar novos triângulos, tomamos um polígono regular de 16 lados. Do ponto de vista geométrico, é possível observar que já se tem a impressão de termos exaurido o círculo, embora saibamos que existem algumas áreas que não foram cobertas.

Continuamos a exaurir o círculo para obter aproximações cada vez melhores para a área do círculo, através de polígonos regulares inscritos de 2n lados.

Usando um procedimento similar a este, com polígonos inscritos e circunscritos, Arquimedes cálculou a área do círculo de raio unitário mostrando que a área A (=Pi) está compreendida entre:

3 + 10 / 71 = 3,140845 < A < 3 + 1 / 7 = 3,142857

O inconveniente do método de exaustão de Arquimedes é que para cada novo problema havia a necessidade de um tipo particular de aproximação. Por exemplo, para obter a área de uma região localizada sob um segmento de parábola ACB.

Arquimedes, usou como primeira aproximação o triângulo ABC, em que C foi tomado de modo que a reta tangente à parábola que passa pelo ponto C seja paralela à reta AB.

De modo semelhante são escolhidos os pontos D e E e construídos os triângulos ACD e BCE.

Na sequência foram construídos mais triângulos com as mesmas propriedades que os outros obtidos nos passos anteriores.

Observamos que tais triângulos estão exaurindo a área da região parabólica.

O Cálculo Diferencial e Integral foi criado por Isaac Newton (1642-1727) e Wilhelm Leibniz (1646-1716). O trabalho destes cientistas foi uma sistematização de idéias e métodos surgidos principalmente ao longo dos séculos XVI e XVII, os primórdios da chamada era da Ciência Moderna, que teve início com a Teoria heliocêntrica de Copérnico (1473-1543).

O que permitiu a passagem do método de exaustão para o conceito de integral foi a percepção que em certos casos, a área da região pode ser calculada sempre com o mesmo tipo de aproximação por retângulos.

Esta foi uma descoberta conceitual importante, mas em termos práticos, a descoberta fundamental foi a possibilidade de exprimir a integral de uma função em termos de uma primitiva da função dada e este fato é conhecido pelo nome de Teorema Fundamental do Cálculo.

Estas idéias serão aqui expostas mas observamos que o conceito de integral pode ser introduzido de várias formas, todas elas tendo em comum a mesma idéia geométrica, mas que se diferenciam pelo rigor matemático utilizado. Neste caso ocorre um problema usual em Matemática: quanto menos rigorosa ou formal é a conceituação de um objeto matemático, mais simples é a sua compreensão, porém é mais inadequada ou de conhecimento inatingível para um ser humano comum, em função das propriedades que decorrem do processo conceitual utilizado.

A idéia ou o conceito de integral foi formulado por Newton e Leibniz no século XVII, mas a primeira tentativa de uma conceituação precisa foi feita por volta de 1820, pelo matemático francês Augustin Louis Cauchy (1789-1857). Os estudos de Cauchy foram incompletos mas muito importantes por terem dado início à investigação sobre os fundamentos do Cálculo Integral, levando ao desenvolvimento da Análise Matemática e da teoria das funções.

Por volta de 1854, o matemático alemão Bernhard Riemann (1826-1866) realizou um estudo bem mais aprofundado sobre a integral e em sua homenagem a integral estudada por ele passou a receber o nome de Integral de Riemann. Tal nome serve para distinguir essa integral de outras que foram introduzidas mais tarde, como por exemplo, a Integral de Lebesgue. A forma usada para introduzir o conceito de Integral de Riemann nos cursos de Cálculo é a versão devida a Cauchy. O que justifica isto é que, ela é simples e bastante acessível aos alunos de um curso de inicial de Cálculo, além de atender aos propósitos de um curso desta natureza.

Nos cursos de Análise Matemática apresenta-se uma versão mais refinada, a Integral de Darboux-Riemann, usando os conceitos de soma inferior, soma superior, integral inferior e integral superior, que correspondem ao método de exaustão usando, respectivamente, polígonos inscritos e polígonos circunscritos.

Mas, para que ninguém alimente idéias equivocadas, observamos que as diversas definições da Integral de Riemann mencionadas são equivalentes e a diferença entre elas se situa na adequação das definições para a obtenção das propriedades da referida Integral.

Como o objetivo deste material é focalizar muito mais as idéias do que uma análise rigorosa das propriedades da Integral de Riemann e considerando que nem todos os visitantes desta página, têm os requisitos de Análise para um enfoque mais rigoroso, apresentamos aqui também a versão mais simples, introduzida por Cauchy.


Partição de um intervalo

Uma partição de um intervalo [a,b] da reta real é um conjunto finito de pontos {xo,x1,...,xn} em R tal que

a=x0 < x1 < ... < xn=b

Ij=[xj,xj+1] é o j-ésimo subintervalo da partição. Dado um intervalo [a,b], podemos tomar uma partição muito particular, como aquela que toma pontos de modo que os subintervalos da partição tenham comprimentos iguais.


Integral de uma função real

Cauchy usou o seguinte processo para definir a integral de uma função real. Consideremos f:[a,b]setaR limitada não negativa, isto é, f(x)>0 ou f(x)=0 para todo x em [a,b] e tomemos uma partição:

a=x0< x1 < ... < xn=b

do intervalo [a,b] que tenha todos os n subintervalos com a mesma medida dx=(b-a)/n.

Tomaremos apenas os primeiros pontos da partição e faremos uma análise geométrica da curva no sub-intervalo [xo,x1]. Para os outros sub-intervalos ocorre uma situação similar. A área sob a curva no intervalo [xo,x1] pode ser obtida através da área S1 do retângulo cuja base mede dx=x1-xo e a altura é a linha tracejada cuja medida é dada por f(c1) onde c1 é um ponto em [xo,x1].

Existe uma compensação da área "branca" que fica acima da curva e dentro do retângulo com a área "branca" que fica abaixo da curva e fora do retângulo.

Em cada subintervalo Ij=[xj,xj+1] desta partição tomamos um ponto genérico qualquer cj e formamos n retângulos, todos com as bases de medida dx e alturas dadas por:

f(c1), f(c2), ..., f(cn)

Se a partição tem n subintervalos, denotamos por Sn a soma das áreas dos n retângulos:

Sn = f(c1)dx + f(c2) dx + ... + f(cn)dx =

sendo a soma realizada sobre todos os j=1...n.

Se essas somas forem calculadas para todos os valores de n, formaremos uma sequência:

{S1, S2, ..., Sn, ...}

Se esta sequência numérica {Sn} converge para um número real bem definido, diz-se que f é integrável no intervalo [a,b] e o valor do limite desta sequência é denotado por:

=spc(1)

A expressão da esquerda é a integral de f entre os limitantes de integração a e b e a expressão da direita é o limite da sequência de somas parciais Sn.


Observações sobre a definição de integral

  1. Devido ao importante trabalho de Riemann, já citado antes, a integral definida pela relação (1) recebe o nome de Integral de Riemann e as somas

    Sn=

    são chamadas de somas de Riemann.

  2. O processo de construção usado na definição da Integral de Riemann sugere que:

    seja definido como a área da figura limitada pelo gráfico de f, pelo eixo OX e pelas retas x=a e x=b.

  3. A existência e o valor do limite (1) deve ser independente da escolha dos pontos c1, ..., cn nos subintervalos de [a,b].

  4. O limite (1) da sequência das somas Sn pode existir ou não. A existência ou não da integral de f, quando o domínio de integração é um intervalo limitado e fechado (compacto) [a,b], depende da regularidade da função f neste intervalo.

  5. Determinar condições necessárias e suficientes para que uma função f tenha integral é uma questão muito delicada e requer conceitos que somente são abordados em um curso mais avançado de Análise Matemática. Para se ter uma idéia desta dificuldade lembramos que este problema só foi completamente resolvido no início do século XX, aproximadamente cem anos após os estudos realizados por Cauchy quando se tentava dar um tratamento rigoroso ao conceito de integral.

  6. Para as nossas necessidades é suficiente saber que toda função contínua definida num intervalo limitado e fechado (compacto) é integrável e que toda função limitada definida num compacto [a,b] é integrável se o número de pontos de descontinuidade da função neste intervalo for finito.

  7. Cauchy tomou uma partição muito particular do intervalo [a,b], subdividindo-o em partes iguais. Podemos refazer o processo com intervalos de comprimentos diferentes, sendo cada intervalo da forma [xj,xj+1] e comprimentos dxj=xj+1-xj. Neste caso as somas de Riemann Sn tomam a forma

    Sn = f(c1) dx1 + f(c2) dx2 +...+ f(cn) dxn =

    Agindo desta forma, devemos tomar uma precaução adicional. Não basta tomar o limite de Sn quando nsetainfinito, mas temos que acrescentar a condição que o maior dos comprimentos dx1, ..., dxn deve convergir para zero. Com isto em mente, temos a notação:

    =

    onde |P|=max{dx1,...,dxn} é a norma da partição P.

  8. Inicialmente fizemos a suposição que f devesse ser positiva. Se f não é necessariamente positiva em [a,b], ainda assim a integral de f pode ser definida pelo mesmo procedimento anterior, sem qualquer problema, mas alguns cuidados devem ser tomados em relação à interpretação geométrica.

    Suponhamos que o gráfico de f seja como na figura acima. Levando em consideração a última observação, podemos formar as somas de Riemann da função f no intervalo [a,b] de modo a incluir um ponto c como um dos pontos da partição.

    Caso exista a integral de f sobre [a,b], verifica-se, que:

     

    b
    int
    a
    f(x) dx = c
    int
    a
    f(x) dx + b
    int
    c
    f(x) dxspc(2)

    Esta propriedade será tratada mais à frente, mas observamos que a primeira integral do segundo membro da relação (2) é positiva, enquanto que a segunda integral do segundo membro é negativa. Desse modo a integral de f sobre o intervalo [a,b] será à diferença das áreas (que são valores positivos) assinaladas com os sinais (+) e (-). Para considerar este caso, a partição do intervalo [a,b] em subintervalos de comprimentos iguais já não é mais adequada.

    A definição de integral é abstrata e não é um instrumento adequado para calcular integrais, razão pela qual o cálculo de integrais geralmente é feito mediante o uso do Teorema Fundamental do Cálculo, que veremos adiante.

    Para melhor entender a definição de integral de uma função f num intervalo [a,b] apresentaremos um exemplo bastante comum.

    Exemplo: Para calcular a área da figura delimitada pela parábola y=x², o eixo OX e a reta vertical x=1, inicialmente dividiremos o intervalo [0,1] em n partes iguais de comprimento dx=1/n.

    Tomaremos os pontos cj como os extremos esquerdos de cada j-ésimo intervalo, de forma que:

    c1=0, c2=dx, c3=2 dx, ..., cn=(n-1)dx

    Para f(x)=x², tomamos h=dx=1/n e escreveremos a soma

    Soma = Sn = f(c1) h + f(c2) h + ... + f(cn) h

    da forma

       Soma = [0² + h² + (2h)² +...+ ((n-1)h)²].h
            = [1² + 2² + 3² +...+ (n-1)²] h³
            = [1² + 2² + 3² +...+ (n-1)²] / n³
            = [n³/3 - n²/2 +n/6] / n³
            = 1/3 - 1/(2n) + 1/(6n²)
    

    Quando nsetainfinito, a expressão da soma se aproxima de 1/3 e segue que:

       1
    int
    0   
    x² dx = 1/3

Propriedades da Integral definida

A definição de integral é abstrata e tem pouco uso operacional. Em função disto, introduzimos mecanismos que facilitam certos cálculos e os principais são as propriedades das integrais.

Proposição: Se f e g são funções integráveis no intervalo [a,b], então f+g é integrável no mesmo intervalo e além disso:

b
int
a
(f+g)(x) dx = b
int
a
f(x) dx + b
int
a
g(x) dx

Proposição: Se f é uma função integrável no intervalo [a,b] e c uma constante qualquer, então a função cf é integrável e

b
int
a
(c.f)(x) dx = c b
int
a
f(x) dx

As duas proposições acima constituem as propriedades lineares da integral definida, sendo que as demonstrações das mesmas são relativamente simples, com o uso da definição de integral apresentada.

Proposição: Se f é uma função integrável nos intervalos [a,c] e [c,b], então f é integrável em [a,b] e além disso:

b
int
a
f(x) dx = c
int
a
f(x) dx + b
int
c
f(x) dx

Esta proposição trata da propriedade da aditividade da integral definida e pode ser demonstrada requerendo um pequeno artifício de incluir o ponto c entre os pontos da partição do intervalo [a,b].

Exercício: Tente demonstrar as proposições ou procure em um bom livro de Análise Matemática.

Construída por Olívio Augusto Weber e Ulysses Sodré.