Matemática Essencial

Ensino Fundamental, Médio e Superior no Brasil

Geometria
Vetores no Espaço Tridimensional
Ulysses Sodré

Material desta página

1 Vetores no espaço R3

Existe uma estreita relação entre vetores no espaço \(R^2\) e no espaço \(R^3\). Na verdade, o conceito de vetor geométrico nos espaços euclidianos é sempre realizado da mesma forma, o que difere são as aplicações mais ricas que existem em \(R^3\).

Definição: Um vetor (geométrico) no espaço \(R^3\) é uma classe de objetos matemáticos (segmentos de reta) que tem a mesma direção, mesmo sentido e mesma intensidade. Esta classe de equivalência de objetos com as mesmas características é representada por um segmento de reta desta família (representante).

O representante escolhido, quase sempre é o vetor \(v\) cuja origem é \((0,0,0)\) e extremidade é o terno ordenado \((a,b,c)\) do espaço \(R^3\), razão pela qual denotamos este vetor por: \(v=(a,b,c)\).

Se a origem do vetor não é a origem \((0,0,0)\in R^3\), realizamos a diferença entre a extremidade e a origem do vetor. Por exemplo, se um vetor \(v\) tem origem no ponto \((1,2,3)\) e extremidade no ponto \((7,12,15)\), o vetor \(v=(6,10,12)\), pois:

\[v = (7,12,15) - (1,2,3) = (6,10,12)\]

Existe uma definição mais ampla do conceito de vetor (nem sempre geométrica) que envolve uma gama variada de objetos matemáticos como: matrizes, conjuntos, funções, soluções de equações diferenciais, etc

1.1 Soma de vetores

Se \(v=(v_1,v_2,v_3)\) e \(w=(w_1,w_2,w_3)\), definimos a soma dos vetores \(v\) e \(w\), por:

\[v+w = (v_1+w_1, v_2+w_2, v_3+w_3)\]

1.2 Propriedades da soma de vetores

  1. Fecho: Para quaisquer vetores \(u,v\in R^3\), a soma \(u+v\) está em \(R^3\).
  2. Comutativa: Para quaisquer vetores \(u,v\in R^3\): \(v+w=w+v\).
  3. Associativa: Para quaisquer vetores $u,v,wR^3 : \(u+(v+w)=(u+v)+w\).
  4. Elemento neutro: Existe um vetor \(\theta=(0,0,0)\in R^3\) tal que para todo vetor \(u\in R^3\), se tem: \(\theta+u=u\).
  5. Elemento oposto: Para cada vetor \(v\in R^3\), existe um vetor or \(-v\in R^3\) tal que: \(v+(-v)=\theta\).

1.3 Aplicações geométricas

Ponto Médio de um segmento: Dado um segmento de reta, cujas extremidades são também as extremidades dos vetores \(v_1=(x_1,y_1,z_1)\) e \(v_2=(x_2,y_2,z_2)\), o ponto médio deste segmento é dado por \(m=(x,y,z)\) onde

\[x=\frac12(x_1+x_2), \quad y=\frac12(y_1+y_2), z=\frac12(z_1+z_2)\]

Centro de Gravidade de um triângulo: Consideremos os vértices de um triângulo, dados pelas extremidades dos vetores \(v_1=(x_1,y_1,z_1)\), \(v_2=(x_2,y_2,z_2)\) e \(v_3=(x_3,y_3,z_3)\). O centro de gravidade deste triângulo é dado pelo vetor \(g=(x,y,z)\) onde

\[x=\frac13(x_1+x_2+x_3),\quad y=\frac13(y_1+y_2+y_3),\quad z=\frac13(z_1+z_2+z_3)\]

1.4 Diferença de vetores

Se \(v=(v_1,v_2,v_3)\) e \(w=(w_1,w_2,w_3)\) são vetores em \(R^3\), definimos a diferença entre \(v\) e \(w\), por:

\[v-w = (v_1-w_1,v_2-w_2,v_3-w_3)\]

Exercício: Dados os vetores \(v=(1,3,4)\) e \(w=(1,8,12)\), construir geometricamente os vetores \(v\), \(w\), \(-v\), \(-w\), \(v+w\) e \(v-w\).

1.5 Produto de escalar por vetor

Se \(k\) é um número real e \(v=(a,b,c)\) um vetor em \(R^3\), definimos o produto de \(k\) por \(v\), como:

\[kv = (ka,kb,kc)\]

1.6 Propriedades do produto de escalar por vetor

Quaisquer que sejam os escalares \(a,b,c\) e os vetores \(v\) e \(w\) em \(R^3\), temos

  1. E1: \(1v=v\)
  2. E2: \((ab)v=a(bv)=b(av)\)
  3. E3: Se \(av=bv\) e \(v\neq\theta\) então \(a=b\)
  4. E4: \(k(v+w)=kv+kw\)
  5. E5: \((a+b)v=av+bv\)

1.7 Módulo de um vetor e vetores unitários

O módulo ou comprimento do vetor \(v=(x,y,z)\) é definido por:

\[|v| = \sqrt{x^2+ y^2+ z^2}\]

Um vetor unitário é o que tem o módulo (comprimento) igual a 1.

Exemplo: Existe um importante conjunto com três vetores unitários de \(R^3\):

\[i=(1,0,0), \quad j=(0,1,0), \quad k=(0,0,1)\]

Estes três vetores formam a base canônica para o espaço \(R^3\), o que significa que todo vetor \(v=(a,b,c)\) do espaço \(R^3\) pode ser escrito como combinação linear dos vetores \(i\), \(j\) e \(k\), assim:

\[v = (a,b,c) = a i + b j + c k\]

Para obter um versor de \(v\), isto é, um vetor unitário com a mesma direção e sentido que um vetor \(v\), basta dividir o vetor \(v\) pelo seu módulo \(|v|\), isto é:

\[u = \frac{v}{|v|}\]

Para construir um vetor \(w\) paralelo a um vetor \(v\), basta multiplicar um escalar \(k\) pelo vetor v, isto é:

\[w = k v\]

As três projeções ortogonais do vetor \(v=(a,b,c)\) sobre os planos \(X=0\), \(Y=0\) e \(Z=0\), são respectivamente, dadas por:

\[v_x=(0,b,c),\quad v_y=(a,0,c),\quad v_z=(a,b,0)\]

Exercício: Quais são os vetores que representam as projeções ortogonais do vetor \(v=(3,4,12)\)? Quais são os módulos de todos estes vetores? Esboce um gráfico com estes vetores.

2 Produto escalar

Dados os vetores v\(=(v_1,v_2,v_3)\) e \(w=(w_1,w_2,w_3)\), definimos o produto escalar (ou interno) entre \(v\) e \(w\), como o escalar real:

\[v \cdot w = v_1 w_1 + v_2 w_2 + v_3 w_3\]

Exemplos: O produto escalar entre os vetores \(v=(1,2,5)\) e \(w=(2,-7,12)\) é:

\[v \cdot w = 1.2 + 2.(-7) + 5.12 = 48\]

O produto escalar entre os vetores \(v=(2,5,8)\) e \(w=(-5,2,0)\) é:

\[v \cdot w = 2.(-5) + 5.2 + 8.0 = 0\]

Exercício: Faça um gráfico, com muito cuidado nas medidas e mostre as posições dos vetores \(v\) e \(w\) do último exemplo.

2.1 Propriedades do produto escalar

Quaisquer que sejam os vetores \(u\), \(v\) e \(w\) e o escalar \(k\):

  1. PE1: \(v{\cdot}w = w{\cdot}v\)
  2. PE2: \(v{\cdot}v = |v| |v| = |v|^2\)
  3. PE3: \(u{\cdot}(v+w) = u{\cdot}v + u{\cdot}w\)
  4. PE4: \((k v){\cdot}w = v{\cdot}(k w) = k (v{\cdot}w)\)
  5. PE5: \(|k v| = |k|\;|v|\)
  6. PE6: \(|u{\cdot}v| \leq |u|\; |v|\) (desigualdade de Schwarz)
  7. PE7: \(|u+v| \leq |u|+|v|\) (desigualdade triangular)

2.2 Ângulo entre dois vetores (Produto Escalar)

O produto escalar entre os vetores \(v\) e \(w\) pode ser escrito na forma: \(v{\cdot}w = |v| |w| cos(t)\).

onde \(t\) é o ângulo formado pelos vetores \(v\) e \(w\). Este ângulo pode ser maior ou igual a zero, mas deve ser menor do que \(180\) graus (\(\pi\) radianos). Com esta última definição, podemos obter o ângulo \(t\), através do cosseno deste argumento \(t\).

\[\cos(t) = \frac{v{\cdot}w}{|v|\;|w|}\]

Exercício: Realizar uma análise sobre o produto escalar de dois vetores, quando o ângulo \(t\) é nulo, quando é reto e quando é raso.

Exercício: Determinar o ângulo entre os vetores \(v=(1,1,0)\) e \(w=(1,1,1)\). Nunca se esqueça de construir um gráfico com esses objetos matemáticos.

2.3 Vetores ortogonais

Dois vetores \(v\) e \(w\) são ortogonais se o produto escalar entre ambos é nulo, isto é, \(v.w=0\).

Exercício: Dado o vetor \(v=(2,3,7)\), quais e quantos são os vetores ortogonais a \(v\) no espaço \(R^3\)? Construa geometricamente esta situação.

3 Produto vetorial

Dados os vetores \(v=(v_1,v_2,v_3)\) e \(w=(w_1,w_2,w_3)\), definimos o produto vetorial (ou exterior) entre \(v\) e$ \(w\), denotado por \(v{\times}w\), como o vetor obtido pelo objeto matemático que não é um determinante mas que pode ser calculado como se fosse um determinante:

\[v{\times}w = \begin{vmatrix} i & j & k \\ v_1 & v_2 & v_3 \\ w_1 & w_2 & w_3 \end{vmatrix}\]

onde \(i,j,k\) são os vetores unitários da base canônica de \(R^3\).

Exemplo: Dados os vetores \(v=(1,2,3)\) e \(w=(4,5,6)\), o produto vetorial entre \(v\) e \(w\) é dado por \(v{\times}w=-3i+6j-3k=(-3,6,-3)\), obtido a partir do determinante. Observamos que o produto vetorial é um vetor em \(R^3\).

\[u{\times}v = \begin{vmatrix} i & j & k \\ 1 & 2 & 3 \\ 4 & 5 & 6 \end{vmatrix} = (-3,6,-2)\]

Tomando \(i=(1,0,0)\) e \(j=(0,1,0)\), que estão no plano do \(z=0\), o produto vetorial destes dois vetores é \(v{\times}w=(0,0,1)\) que é um vetor que está fora deste plano, daí a razão deste produto ser denominado exterior.

Em geral, o produto vetorial \(v{\times}w\) é um vetor ortogonal a \(v\) e também ortogonal a \(w\), isto é, o produto vetorial é ortogonal ao plano que contém os dois vetores \(v\) e \(w\).

3.1 Propriedades do Produto Vetorial

  1. PV1: \(v{\times}w = -w{\times}v\)
  2. PV2: \(u{\times}(v+w) = u{\times}v + u{\times}w\)
  3. PV3: \(k(v{\times}w) = (k v){\times}w = v{\times}(k w)\)
  4. PV4: \(i{\times}i = j{\times}j = k{\times}k = 0\)
  5. PV5: \(i{\times}j = k, j{\times}k = i, k{\times}i = j\)
  6. PV6: Se \(v{\times}w=0\) (\(v\) e \(w\) não nulos) então \(v\) e \(w\) são paralelos

3.2 Ângulo entre dois vetores (produto vetorial)

O produto vetorial entre os vetores \(v\) e \(w\) pode ser escrito na forma:

\[v{\times}w = |v| |w| \operatorname{sen}(t)\;U\]

onde \(t\) é o ângulo formado pelos vetores \(v\) e \(w\), e \(U\) é um vetor unitário que é paralelo ao produto vetorial \(v{\times}w\), logo \(U\) é perpendicular a \(v\) e também perpendicular a \(w\).

Tomando o módulo em ambos os lados da igualdade acima, obtemos:

\[|v{\times}w| = |v| |w| \operatorname{sen}(t)\]

Junto com esta última definição de produto vetorial, podemos obter o ângulo \(t\in[0,\pi]\), entre dois vetores \(v\) e \(w\), através de:

\[\operatorname{sen}(t) = \frac{v \times w}{|v| |w|}\]

3.3 Aplicações do Produto Vetorial

Área do paralelogramo: Sejam dois vetores \(v\) e \(w\) com um mesmo ponto inicial, de modo a formar um ângulo diferente de zero e também diferente de \(\pi\) radianos.

O módulo do produto vetorial entre \(v\) e \(w\) pode ser interpretado como a área \(A\) do paralelogramo que tem \(v\) e \(w\) como lados contíguos.

\[A = |v{\times}w|\]

Área do triângulo: A metade do módulo do produto vetorial entre \(v\) e \(w\) pode ser interpretada como sendo a área \(A\) do triângulo que tem dois lados como os vetores \(v\) e \(w\), com origens no mesmo ponto, isto é:

\[A = \frac12 |v{\times}w|\]

4 Produto misto e algumas aplicações

Dados os vetores \(u=(u_1,u_2,u_3)\), \(v=(v_1,v_2,v_3)\) e \(w=(w_1,w_2,w_3)\), definimos o produto misto entre \(u\), \(v\) e \(w\), denotado por \([u,v,w]\) ou por \(u\cdot(v{\times}w)\), como o número real obtido a partir do determinante

\[[u,v,w] = u{\cdot}(v×w) = \begin{vmatrix} u_1 & u_2 & u_3 \\ v_1 & v_2 & v_3 \\ w_1 & w_2 & w_3 \end{vmatrix}\]

Volume do paralelepípedo: O valor absoluto (módulo) do produto misto entre \(u\), \(v\) e \(w\) (nesta ordem) é o volume \(V\) do paralelepípedo que tem as 3 arestas próximas dadas pelos vetores \(u\), \(v\) e \(w\), sendo que estes vetores têm a mesma origem.

Assim:

\[V=|[u,v,w]|\]

Volume do tetraedro: Um sexto do módulo do produto misto entre \(u\), \(v\) e \(w\) representa o volume do tetraedro (pirâmide com base triangular) que tem as 3 arestas próximas dadas pelos vetores \(u\), \(v\) e \(w\), sendo que estes vetores têm a mesma origem.

\[V(\text{tetraedro}) = \frac16 |[u,v,w]|\]