Professor César Bessa: "A arte sensibiliza e dá uma visão mais humanista"
O Direito é visto como uma ciência dogmática, pela qual conceitos e atos devem ser simplesmente aceitos como verdades absolutas. O professor César Bessa (Departamento de Direito Público) explica que, oposta a esta teoria, existe a visão zetética (do grego "zetein" = perquirir) do Direito, pela qual qualquer premissa pode ser questionada e até desconstituída.
Para o professor, a Arte é uma ferramenta adequada para atuar segundo a visão zetética. Ele coordena o Cinejus, um projeto de ensino e pesquisa que tem como objetivo educar para o Direito com uma visão mais humanista. "Uma educação pela sensibilização pela arte", sintetiza. O projeto tem antecedentes distantes: na década de 80, o Centro Acadêmico do curso promovia sessões de cinema e debates. Antes do Cinejus existiu o Cinejur, cuja primeira exibição foi "A hora do porco" (1993), filme ambientado no século XV, quando os animais podiam ser processados criminalmente.
Atualmente, o projeto tem uma dinâmica que inclui sessões de filmes alternadas com aulas e debates a partir de leituras de textos complementares. Um grupo de monitores, integrantes do projeto, seleciona os filmes. Bessa conta que eles são do curso de Direito, mas já aconteceu de sugestões virem de outros cursos, como Administração. As exibições costumam ser às terças-feiras no Anfiteatro do Centro de Estudos Sociais Aplicados (CESA), e são abertas a todos os interessados. São anunciadas por cartazes e na Universidade FM. Na Central de Fotocópias do Centro de Ciências Humanas fica uma pasta com textos para subsidiar as discussões feitas na terça seguinte ao filme. Frequentemente os alunos também fazem resenhas dos filmes.
Filmografia
O professor César ministra atualmente as disciplinas de Introdução do Estudo do Direito (IED) e Direito do Trabalho. A lista de filmes já exibidos é longa e inclui "O Vento será tua herança" (1960), "Laranja Mecânica" (1971), "Não matarás" (1988), "A língua das mariposas" (1999), "A vida dos outros" (2006), "Lunar" (2009), "El patron" (2013) e "Labirinto de mentiras" (2014). As produções brasileiras não ficam de fora, como "Eles não usam black tie" (1981) e "O homem que virou suco" (1981). Este até foi objeto de trabalho de conclusão de curso, e não foi o único. O projeto já rendeu artigos e apresentações em eventos científicos.
Especificamente para IED, o professor destaca "A guerra do fogo" (1981), "Giordano Bruno" (1973) e "Aquarius" (2016), entre outros. Para Direito do Trabalho: "Amistad" (1997), "Germinal" (1993) e "Sufragistas" (2015). Eventualmente, são exibidos também documentários, como "Carne, Osso" (2011).
Além do cinema, Bessa recorre a mais expressões da arte como teatro e literatura. E aí entram Shakespeare, Machado de Assis e Clarice Lispector, entre outros. Nelas, o professor procura aspectos úteis às aulas e à formação humanística dos alunos. A peça "Santa Joana dos Matadouros" (de Bertold Brecht), por exemplo, foi usada para discutir o Direito do Trabalho na época da Revolução Industrial. Assim, ele assiste aos filmes, lê, compra, vai desenvolvendo uma crítica e estabelecendo um diálogo entre o Direito e a Arte, especialmente o cinema.
Um desses aspectos são as relações entre a tecnologia e os seres humanos. Bessa lembra de Herbert Marcuse (1898-1979), filósofo e sociólogo alemão que denunciou o desenvolvimento descontrolado da tecnologia e a ideologia que a colocou no centro das atenções da sociedade. O pensador afirmou que estes e outros fatores geraram o "homem unidimensional" (obra de 1964), que é reprimido e transformado em defensor do status quo. Muitos filmes, segundo Bessa, demonstram como a padronização do pensamento e do comportamento conduzem a uma sociedade dominada por líderes fascistas. A Arte sempre se insurgiu contra este movimento em favor de um pensamento único.
