O artista Pedro Gandra respondeu algumas questões feitas pela DaP, também. Reside em Brasília – DF e participa da 3ª exposição ARTE LONDRINA 7 – Precipitações, com o trabalho Correspondências Incompletas: Exploda através das montanhas.

 

Este trabalho faz parte da série Correspondências Incompletas que surgiu da intenção de extrair a representação da figura humana da paisagem, fragmentá-la e posicioná-la em outra peça, sempre em um formato menor em relação à peça que contém a paisagem. E assim, provocar outro tipo de situação dialógica. O processo de elaboração dos trabalhos se desenvolve no momento que começo a esquematizar, mentalmente, uma composição na qual estariam compreendidas a relação e a disposição de uma figura, inserida numa situação de paisagem. Sem projetos ou estudos prévios, extraio esta figura da paisagem, fraturando a situação narrativa, previamente mentalizada.

 

– Pedro Gandra

 

COM QUEM TEM AS MELHORES CONVERSAS SOBRE O QUE TE INTERESSA COMO
ARTISTA?
As melhores conversas acontecem com amigos e familiares, quando trocamos ideias e falamos um pouco de tudo. Existe um constante cruzamento de referências, coisas que jamais poderia imaginar ou perceber por certo ângulo e que só se fazem possível por conta deste diálogo aberto e contínuo. O que me interessa como artista, também não é, em nada, diferente do que me interessa como pessoa. São trocas naturais e necessárias.

 

COMO UM TRABALHO COMEÇA?
É muito difícil precisar quando exatamente um trabalho começa. Não acredito que um trabalho finalize, bons trabalhos não finalizam. Um bom trabalho é aquele que te leva para outro trabalho, se é uma ideia que se esgota em si mesma, não me interessa muito. Não faço esboço, não projeto. Todas as ideias de tema e composição são acumuladas em notas de celular, junto de referências, a maioria delas literárias. Passagens de livros, autores que imagino que possam ser interessantes para ler ou reler naquele momento, escritos meus, reflexões sobre o processo… Essas notas servem como estímulo para começar, continuar e pensar os trabalhos.

 

QUE ARTISTAS OU TEÓRICOS VOCÊ CONSIDERA IMPORTANTES? POR QUÊ?
Ana Miguel, Patrícia Leite, Guignard, James Whistler, Eva Hesse, Paula Rego, Wilma Martins, Pierre Huyghe, Isa Genzken, Kiki Smith. Poderia citar outros… Através das obras desses artistas, o horizonte do meu pensamento em arte se ampliou. Susan Sontag, Georges Didi-Huberman, Maurice Blanchot, Yve-Alain Bois e Rosalind Krauss têm uma importância significativa na minha formação.

 

O QUE VOCÊ ESTÁ LENDO?
Sempre tenho alguns livros que estão em leitura, por hora estou lendo Os Frutos da Terra, de Andre Gide; Coral e Outros Poemas, de Sophia de Mello Breyner Andresen; A Memória de Nossas Memórias, de Nicole Krauss; Notas Sobre o Cinematógrafo, de Robert Bresson; Ruibarbo do Deserto, de Léo Tavares; e Pé do Ouvido, de Alice Sant’Anna.

 

QUE TIPO DE COISA CHAMA SUA ATENÇÃO NO MUNDO?
Aquele instante que por alguma razão desconhecida você se desocupa do mundo. Aquele instante de dispersão, onde as coisas que te pareciam certas, seguras e sólidas entram em um estado outro, líquido e impreciso. Quase como uma miragem mental.

 

O QUE VOCÊ ESTÁ PRODUZINDO AGORA?
Pinturas. Ainda não sei o que vai ser ou como vai ser. Mas, é neste não saber que o trabalho vai tomando forma.

 

QUE MÚSICA VOCÊ OUVE?
Charli XCX, Dvořák, Mitski, Ernesto Nazareth, Serejo, Sara não tem nome, Pierre Boulez, Weyes Blood, Taylor Swift, Maurice Ravel, Grimes, Solange, Caetano Veloso, Edith Piaf, Big Thief, Robyn, Maria Bethânia, Erik Satie, Marisa Monte, Björk, Nico Muhly, Guerra-Peixe, Ella Fitzgerald, Cat Power, Rosália, The 1975, Gal Costa, Serpentwithfeet, Angel Olsen, O Terno, Elizeth Cardoso, Melody Gardot, Cory Henry, Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz, Egberto Gismonti, Clairo, Snail Mail, Sufjan Stevens….

 

QUE EXPERIÊNCIA FOI IMPORTANTE PARA QUE VOCÊ SE ENTENDESSE COMO
ARTISTA?
Durante minha experiência na Escola de Artes Visuais do Parque Lage no Rio de Janeiro, tive o privilégio de ser aluno do João Magalhães, que recentemente nos deixou. João me ensinou a enxergar a minha produção por mim mesmo e me responsabilizar por ela. Talvez, tenha sido este o momento mais potente que vivi como aluno. A partir disso, fiquei cada vez mais interessado em desenvolver uma produção e uma investigação em arte, que passasse pelas minhas referências e pelas minhas experiências e vivências no mundo. Acho que este foi um importante momento de transição, mas este momento talvez jamais acontecesse sem João Magalhães.

 

DESLOCAMENTO, DESMEMBRAMENTO, APROXIMAÇÕES SÃO RECURSOS NARRATIVOS, DE EDIÇÃO, COMUNS NOS SEUS TRABALHOS E TAMBÉM NO CINEMA. É POSSÍVEL FAZER ASSOCIAÇÕES ENTRE O QUE VOCÊ FAZ E A LINGUAGEM CINEMATOGRÁFICA? QUAIS?
Acredito que sim. As ideias de montagem e sequência são questões que permeiam meu trabalho. Sempre penso a questão narrativa como um acontecimento não linear, que possa estimular um exercício da presença do tempo na cena ali disposta na pintura. Um exercício, onde a cena ali estática, na sua frente evoque para além do que está no tempo presente da composição, e também sugestione o que poderia ter acontecido antes e o que pode vir a acontecer. Propor esta tensão narrativa. Penso em cena, penso em paisagem como cenário, esses são recursos também utilizados no cinema. Quando desmembro os trabalhos em dípticos, especialmente na série Correspondências Incompletas, penso como um processo de edição. Idealizo, mentalmente, a composição de uma paisagem/situação compreendendo nela, uma personagem. Neste mesmo processo, ainda mental, já extraio a personagem da sua paisagem e a isolo. No momento em que executo a pintura desmembro em duas peças criando um díptico, sendo que a peça que contém a paisagem é maior em dimensão em relação à peça que contém a personagem. Separo buscando uma
situação dialógica.

 

QUE TIPO DE FICÇÃO, DE NARRATIVA INTERESSA PARA O SEU TRABALHO?
Interessa-me uma narrativa aberta, ambígua e fragmentada. Não me interessa uma narrativa intransigente. Proponho sugestões, possiblidades de leituras.

 

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