ENTREVISTA COM O ARTISTA XIKÃO XIKÃO
O artista Xikão Xikão vive e trabalha em Belo Horizonte (MG) e respondeu algumas questões feitas pela DaP. Ele participa da 3ª exposição do ARTE LONDRINA 7, Precipitações, com os trabalhos ALTERselfie e Selfie-Service.
“As diversas tecnologias de comunicação que usamos em nossa vida cotidiana redimensionaram intensamente nossas formas de presença e visibilidade na vida social. Dentre estas mudanças está a substituição do sujeito que registra o mundo por trás da sua câmera pelo sujeito que registra a si mesmo com o braço estendido segurando um smartphone. Como afirma Fontcuberta : Em um giro copernicano, a câmera desgruda do olho, afasta-se do sujeito que a controlava e, à distância de um braço estentido, volta-se para fotografar justamente esse sujeito. Acabamos de inventar a selfie.
Parte do nosso entendimento sobre a identidade, o gênero, a sexualidade, a raça e outras questões perpassa as novas formas de autorrepresentação como a selfie ou até mesmo a nude. Ocorre uma mudança estrutural, a autorrepresentação deixa de ser um registro para se tornar uma performance. E essa mudança estrutural não acontece somente no ato fotográfico, mas também em todas as dinâmicas de publicação, circulação e interação dessas imagens.”
-Xikão Xikão
COM QUEM TEM AS MELHORES CONVERSAS SOBRE O QUE TE INTERESSA COMO ARTISTA?
Geralmente depois das vernissages, com os curadores e artistas e mediadores da exposição. Foi assim no Arte Londrina 7.
COMO UM TRABALHO COMEÇA?
No meu caderno,
Anotando
Desenhando
No meu celular
Fazendo Fotos
Fazendo Videos
O mais difícil de entender é quando ele termina
Quando um trabalho termina ?
QUE ARTISTAS OU TEÓRICOS VOCÊ CONSIDERA IMPORTANTES? POR QUÊ?
1. Joan Fontcuberta, La furia de las imágenes
2. Paula Sibilia, O show do Eu – A intimidade como espetáculo
3. Joan Fontcuberta, A câmera de Pandora: A fotografia depois da fotografia
4. John Yuyi
O QUE VOCÊ ESTÁ LENDO?
Tenho tentado ler o filósofo coreano Byung-Chul Han mais especificamente o livro No Enxame: reflexões sobre o digital. Mas creio estou fracassando na leitura (risos) pois confesso que como millennial tenho tido dificuldades de terminar livros.
Mas eu adoro literatura contemporânea e acabei de ler Outros jeitos de usar a boca da Rui Kapur e estou namorando o novo dela O Que O Sol faz com as Flores.
QUE TIPO DE COISA CHAMA SUA ATENÇÃO NO MUNDO?
Memes, espelhos, drags, zentai, furry, eleitores do bolsonaro arrependidos, selfies, nudes, a história da autorrepresentação ao longo da história da arte, artistas lgbt, algoritmos, meu feed no youtube, a crescente precarização do trabalho e como não estamos percebendo esse fato, , a crescente destruição do planeta pelo agronegócio e como estamos colocando a culpa nos canudos de plástico, pornografia, o cinema nacional, o japão, a vertiginosa destruição da democracia brasileira pelo governo bolsonaro e como estamos reagindo a isso, harmonização facial, memes de novo, videogames, glitches, o modo como legitimamos nossa identidade através dos likes, os 33% da população brasileira que não quer ter ou não tem acesso as redes sociais, as fake news, as mudanças políticas do ciberespaço, a Pabllo Vittar indo longe demais, movimento bodypositive, realidade virtual, exposições de arte, museus de arte, o mercado de arte, o sistema da arte, os artistas contemporâneos e receitas veganas.
Já falei memes ?
O QUE VOCÊ ESTÁ PRODUZINDO AGORA?
QUE MÚSICA VOCÊ OUVE?
Tô completamente OBCECADO pela Rosalía. La Rosaliaaaaaaaaa
Pero también tengo oído otrxs cantantes hispanohablantes, como por ejemplo:
Tenho ouvido bastante algumas remixes do disco de remixes da Letrux e sempre as músicas-conceito da GA31. (Você quer conceito arroba ?)
e claro
SEMPRE
SEMPRE
SEMPRE
QUE EXPERIÊNCIA FOI IMPORTANTE PARA QUE VOCÊ SE ENTENDESSE COMO ARTISTA?
A primeira individual a gente nunca esquece.
(A minha foi, Persona, lá em 2015, no Centro Cultural de Contagem.)
PODEMOS PENSAR NUMA PATOLOGIA DA AUTORREPRESENTAÇÃO, VIA SELFIES E REDES SOCIAIS, NA CONTEMPORANEIDADE. COMO SEU TRABALHO SE CONSTITUI NESTE TERRITÓRIO?
É importante denotar que tanto ALTERselfie como Selfie-Service que estão expostos no Arte Londrina 7 são trabalhos que buscam entender, questionar, mapear e categorizar essa selfiemania contemporânea.
Através dos textos de Selfie Service, lanço perguntas ao espectador; quem fazia autorretratos antes de existir as selfies? A selfie precisa ser postada nas redes sociais ou sua existência não está atrelada a sua circulação? É possível compreender as dinâmicas de poder das selfies? A selfie pode corroborar para criação de novos padrões de beleza? Como estamos construindo nossas identidades contemporâneas a partir da selfie? São alguns questionamentos que o trabalho traz.
E tais questionamentos vão se modificando ao longo do tempo, pois o próprio trabalho está em constante processo. Desde 2016, quando surgiu o trabalho, já foram acrescentadas novos textos , modificado alguns. Agora em Londrina são 72 textos (em papel e espelho) e cerca de 36 são inéditos.
Já ALTERselfie vai trazer a reflexão sobre identidade e alteridade através das selfies. Nesse processo de autoficcionalização e autoespetacularização da própria identidade nas redes sociais, quem são os nossos semelhantes/pares/sósias/duplos? É possível criar singularidades na redes sociais ou depois de um tempo fica tudo igual? Assim através de selfies coletadas nas redes sociais de rapazes parecidos comigo lanço essas questionamentos para os espectadores.
Esse trabalho, também surgido em 2016, também é um processo de constante coleta e modificação. No Arte Londrina 7 são 250 selfies, sendo que cerca 100 são inéditas.
O mais importante de observar que em ambos os trabalhos me coloco como provocador desse território. As respostas não estão prontas e cabe ao espectador responde-las.
A REPETIÇÃO DE POSES, CENÁRIOS E PROPÓSITOS CONTRARIA AS INTENÇÕES DE ORIGINALIDADE DOS SELFIES, TODOS NOS PARECEMOS MUITO UNS COM OS OUTROS. COMO É ENCONTRAR IMAGENS DE PESSOAS QUE SE PARECEM COM VC?
Da primeira vez foi uma sensação muito estranha. Era uma foto de um rapaz de costas e mostrava parte do rosto e barba e eu me via naquele corpo e acreditava que era meu próprio corpo embora eu soubesse que não poderia ser. Essa dúvida me assombrou por um tempo. Isso aconteceu em 2009, no finado Orkut (risos).
Desde então eu venho me deparado cada vez mais com rapazes parecidos comigos , principalmente no Instagram. Mas o estranhamento continua, embora em menor grau.
E nessa busca por doppelgangers tenho até encontrado rapazes parecidos comigo com ROUPAS IGUAIS as minhas.
[ Doppelgänger (alemão: [ˈdɔpl̩ˌɡɛŋɐ] (escutar (ajuda·info))), segundo as lendas germânicas de onde provém, é um monstro ou ser fantástico que tem o dom de representar uma cópia idêntica de uma pessoa que ele escolhe ou que passa a acompanhar, o que hipoteticamente pode significar que cada pessoa tem o seu próprio. Também são conhecidos como duplo-eu ou sósia.]
bizarro!
Abaixo seguem fotos do artista e de seu ateliê: